Flagelo da fome desafia nutrição de qualidade

29/08/2022 14h32 ⋅ Atualizada em 01/09/2022 16h55

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“Sou lança afiada que penetra até mesmo o mais duro homem, sei que você já sabe, mas torno a repetir, ‘muito prazer, meu nome é fome’.” Esse poema de Felipe Rima completa 10 anos em 2022, e seu alerta permanece atual para mais de 61 milhões de brasileiros afetados pela insegurança alimentar, conforme relatório mais recente da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). O relatório, divulgado em julho deste ano, ainda aponta que 15,4 milhões de pessoas enfrentaram situação de insegurança alimentar grave entre 2019 e 2021. Isso tudo em meio a um desperdício anual de 27 milhões de toneladas de alimentos por ano no país, ainda segundo a ONU.

Erradicar a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável integram o conjunto de 17 Objetivos de desenvolvimento sustentável da agenda 2030 da ONU - esse é o ODS 2. E colaborar para chegarmos a esse cenário é um desafio para mais de 187 mil nutricionistas no Brasil. O dia 31 de agosto marca essa profissão, dedicada à saúde, ao bem-estar e ao desenvolvimento do país.

 “A insegurança alimentar grave, por exemplo, é quando eu entrei na escassez, não consegui alimentar a minha família, atendendo as demandas nutricionais de cada um. Ainda assim, entendo, do ponto de vista de acesso e da dignidade humana, que todas as inseguranças alimentares são, de fato, graves. Nenhuma pessoa fica tranquila se percebe que vai ficar sem alimento”, afirma a Profa. Dra. Fabíola Figueiredo Nejar, do curso de Nutrição da Universidade de Taubaté (UNITAU).

A nutricionista lembra que esse é um tema grave, urgente e, infelizmente, recorrente em território nacional. “Entendo que teve o impacto da pandemia nesses últimos dois anos, mas temos outros fatores que sempre influenciaram essa questão da alimentação e da escassez dietética que a gente vive em nosso Brasil. Não posso deixar de citar Josué de Castro, que trabalha o mapa da fome no Brasil lá na década de 30 do século passado. Ele já identificava carências nutricionais importantes entre nós, brasileiros. Um dos fatores sobre os quais a gente não pode deixar de falar, é a questão de políticas públicas que implicam diretamente no acesso ao alimento”.

Taubaté também sofre os efeitos dessa realidade. Professores e alunos que atuam no Centro de educação alimentar e terapia nutricional (Ceatenut) da UNITAU têm percebido um aumento no número de atendimentos de famílias em situação de risco. No primeiro semestre deste ano, o Ceatenut registrou 648 atendimentos, um aumento de 9,64% em relação ao mesmo período do ano passado. Em alguns desses casos, houve necessidade de encaminhamento das pessoas para os Centros de referência de assistência social (CRAS) da prefeitura.

  “A gente fez uma discussão com os alunos sobre insegurança alimentar para eles ficarem preparados para o público que vão atender. Percebemos que eles se sensibilizaram muito. Atendemos pessoas que vivem de reciclagem e têm uma renda mensal de R$ 500,00. Isso para sustentar uma família com mais três pessoas. Geralmente, fazemos esse encaminhamento para o CRAS. Lá, ela vai fazer o cadastro único e, por meio disso, a assistente social vai ver quais benefícios pode ter”, avalia a coordenadora do Ceatenut, profa. Esp. Maria Claudia Diniz Figueiredo.

De acordo com a coordenadora, mesmo com o acesso das famílias à renda pela inclusão em programas de benefícios assistenciais, ainda cabem orientações quanto ao consumo correto de alimentos. “Muitas vezes essas pessoas não sabem direcionar essa renda. Compram alimentos que enchem a barriga, alimentos ultraprocessados. Esse é o nosso primeiro direcionamento, um trabalho de educação nutricional. Preparar hortas caseiras, ir à feira no período final, fazer o reaproveitamento de alimentos, comprar alimentos na safra. Questões que envolvem a aquisição, o preparo e a conservação dos alimentos.”

A fala da coordenadora do Ceatenut é reforçada pela profa. Fabíola Nejar. “As soluções não são mirabolantes. Entendo que o papel do profissional nutricionista é micro, pensar nas comunidades locais, em projetos de construção de cozinhas comunitárias.  Vamos planejar como fazer. Se eu tenho um arbusto de orapronobis em casa, por que não posso usar isso em um prato uma vez por semana?”

Entre os alunos que atuam no centro, a percepção é de que eles podem fazer a diferença.

Gabriel Vinicius dos Santos Silva, estudante do 7º período de Nutrição, disse que o treinamento foi importante para poder conseguir acolher as famílias e fazer os encaminhamentos necessários. “Quando a gente entrou no estágio, a gente teve um treinamento para saber qual é o público de prevalência. Não esperava que iria acontecer com tanta frequência. No dia a dia, isso está muito notório, 90% dos pacientes que atendo estão em algum grau de insegurança alimentar”.

Para Hadassa Markel Loyola Diniz Rodrigues, colega de Gabriel que também integra a equipe de atendimento do Ceatenut, a oportunidade de ajudar as famílias traz um enriquecimento profissional. “Poder realizar atendimentos antes mesmo de me formar é muito enriquecedor, ainda mais sabendo que estou podendo ajudar em estratégias nutricionais, orientações e prevenção de doenças por meio da alimentação de um amplo público. A maioria da população que atendemos é de famílias que não teriam condições financeiras de pagar pela consulta”.

O Ceatenut da UNITAU completou 15 anos de atividades em 2022. Para marcar esse período e o Dia do Nutricionista, o centro programou em 31 de agosto uma visitação aberta às instalações, das 13h30 às 15h30, com inscrições a serem realizadas pelo instagram @ceatenut.unitau (link bio). O Ceatenut fica na avenida Marechal Arthur da Costa e Silva, nº 1.055. Mais informações sobre o curso de Nutrição da UNITAU estão disponíveis aqui.

ACOM/UNITAU